Parece coisa de pretenso guru motivacional, que agora está tanto na moda, mas há que reconhecer-lhe mérito (não aos "pretensos" mas aos princípios deste tipo de filosofia): a vida pode ser uma grande m****. Na maioria das vezes, até o é, de facto. Mas nós temos que a viver, não há saída... não será de responder ao fatalismo escolhendo saborear verdadeiramente o resto?
Se pensarmos bem, o mais fácil é deixar-nos afundar na dita ( errr... m****? Sim, m****) porque não requer qualquer tipo de esforço, basta fazer corpo mole e lá vamos nós. Difícil é nadar contra a corrente e tentar que a cabeça fique à tona. Dir-me-ão: isso é tudo muito bonito, uma linda alegoria, ainda que por demais batida, mas nem sempre temos forças. Verdade. É a mais pura das verdades! E ninguém pode ser condenado por isso. A dor pesa. O sofrimento pesa. São pesos extra amarrados aos pés. Há dias, há fases, às vezes, há meses e anos em que levam a melhor: os pesos, a m**** da vida, a corrente de forças contrárias à nossa vontade, ao que nos faz feliz. É uma pena, é um desperdício de tempo que não volta mas é verdade e é humano e, talvez, até faça parte do caminho, não sei. Sei, sim, que devemos - a nós próprios, a mais ninguém -, quando encontramos um sopro de força cá dentro que nos dê um empurrão, tentar apanhar a onda, como podermos. Esqueçam-se do perfeccionismo, se só conseguirem encavalitar-se na prancha de joelhos ou agarrá-la com as mãos, que seja. Que seja! Não tem que ser bonito, não tem que ser vistoso, basta ser. Porque há vida para além da m****. Há dores no corpo mas também há beijos ternos de manhã que ajudam a aliviá-las. Há tardes sisudas e fracas de espírito mas também há Chopin ao piano que atravessa as paredes vindo da casa ao lado. Há ordens para não sair e há amigos que, sendo assim, entram, carregados de almoço ou lanche pronto a ser consumido e que riem connosco na nossa clausura. Há medo mas há esperança e rezas de tio adorado mas já velhinho todas as noites. Há vómitos e cabeça a latejar mas há medalha de santa com o nosso nome trazida de propósito por amigo que considerávamos distante. Há amor, há amizade, há solidariedade, há carinho, há presença, há atenção, há família, de sangue e alargada e que se escolhe. E há dias sem dores. E sem má disposição. E com apetite. E em que o café nos volta a saber bem...
Revisitei há uns dias uma frase feita daquelas bonitas que inundam as redes sociais e que adornam perfis no campo dos motes de vida. Dizia qualquer como coisa: a vida é o que queremos que seja. Pois, às vezes não é. Uma parte, talvez bem maior do que gostaríamos de admitir, não é. Ainda apanhei a febre do empowerment no meu crescimento enquanto pessoa mas, talvez felizmente, tenha ido ainda a tempo de o saber finito, com limites. Temos sempre poder para tentar mudar a nossa vida. Sempre. Mas a nossa força também reside na aceitação do que não passa por nós decidir e, acima de tudo, na capacidade de viver o melhor possível as entrelinhas, as entrelinhas que cosem os momentos uns aos outros e que os enfeitam, as entrelinhas que são, nem mais nem menos, a nossa expressão e a forma como decidimos viver tudo o que a vida nos impõe e todo o terreno que lá lhe vamos conseguindo conquistar.
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