E disse-me "tome nota dos seus sonhos" mas eu ignorei. Ou melhor, adiei, fui adiando, agora não, talvez amanhã, até que me assumi que não me apetece. E ainda bem. Não creio que o meu caderninho preto tolerasse tal engorda das suas páginas. Porque tem sido uma constante: vívidos, marcantes, a cores, de formas concretas, detalhados. Acordo cansada e conseguindo apontar o dedo a caras, locais e circunstâncias; revejo saudades, revisito questões, até assumo missões a levar a cabo ao acordar. Vivo uma vida paralela, portanto...
E ouço "acho-te muito bem, estás óptima" e pergunto-me se devia estar "muito bem" e "óptima". Cada vez que me elogiam, intrigam-me, plantam dúvidas no meu sentir. Mas eles não sabem nem sonham que o meu sentir também sabe e sente que há-de haver um dia em que hei-de quebrar, em que a minha realidade, que até agora parece apenas levitar em torno da minha pessoa, se me há-de cair em cima e encharcar até aos ossos. Dá-me ideias que tenho estado demasiado ocupada a geri-la para a sentir...
E pergunto "há ironia maior?". Deve haver mas esta é das grandes. Anos e anos de deserto, alguns deles de uma sede quase mortal, e agora a vida acena e ri-se, de braço dado à oportunidade que eu não posso agarrar. Devem ir ao cinema... "Mas vai também", dizem-me, e eu rio-me mas sem vontade...
E exijo-me "não te deixes intimidar, agarra o momento pelos cornos e faz dele o que queres que seja". E eu sei que chegou a hora..
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