quarta-feira, dezembro 27, 2017

Crónica natalícia

Vi-o chegar com alguma desatenção, de tão cheia que estava de acontecimentos e afazeres. Já não o vivo como antes mas a memória de alguns natais passados espicaçou-me - a prova que há assombrações benditas -  e enchi-me o que pude dele: luzes e a costumeira ronda pela cidade para as contemplar regada a vinho quente ou a ginginha; açúcar e canela em medida boa; o forno a testar variações de biscoitos; embrulhos mais ou menos bem conseguidos; os doces tradicionais, os que sempre se fizeram na família e os de tradições mais recentes, da minha geração, mas que já ninguém dispensa - "vais fazer o teu doce, não vais?"- (de forma inusitada, a receita teve o desplante de me desafiar quatro vezes e só um copo de vinho tragado no momento certo me impediu de a fazer voar pela janela fora). E ainda houve tempo para não deixar escapar o Miró. De mãos dadas, barrete de lã e vontade de não nos darmos por garantidos. Nem a nós, nem a nada. Debaixo da árvore jogou-se à sorte com a promessa de viagens a mares quentes e vista para palmeiras já no primeiro trimestre e a família reuniu-se e uniu-se, os mais velhos a requerer cuidados, os mais novos a encher a sala de risos, os homens e mulheres que agora estão ao leme a unir as duas pontas entre piadas e brindes. A seguir vem o novo ano, a seguir vêm os desejos. Não sei qual a carta que rege o meu signo em 2018 mas confesso que não me interessa. Se houve ensinamento dado pelo ano que agora termina foi o de que o futuro é, decididamente, sobrevalorizado.


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