terça-feira, abril 08, 2014

"Outro" sol





















Chamei-lhe "outro" sol sem ter que pensar. "Outro" sol, que entra e ilumina um outro chão, de uma outra vida. Um espaço que me sussurra sentimentos contraditórios: um espaço que é meu e também não é, onde ainda me encontro para logo a seguir me desencontrar e até estranhar, onde me reconheço e desconheço num mesmo momento, onde me sinto presente e tão mas tão distante, onde o calor frio (calafrio?) desse "outro" sol, me confunde e me incomoda.

Um "outro" sol, que  - amálgama de memória - faz lembrar novos sóis, de nova vida, a entrar pela janela dos dias que ali começavam e que eram novos também, sinónimos de liberdade e estrada própria, menina que finalmente voa para fora do ninho e se vê por sua conta. E era este "outro" sol que abrilhantava esse caminho. Um sol que irrompia com cheiro de começo e de novidade, com chilrear de pássaros e aroma a flores.

Mais tarde, um "outro" sol - amálgama de memória -,  de construção, de alicerces, de bases... ou fosse o que fosse que se parecia com isso...

Por fim, um "outro" sol - amálgama de memória -: ali, a cair naquele chão - sol fresco de manhã cedo - onde caíram também as notas que, em sobressalto, me avisaram da chegada de negras novas que iriam ditar o que se seguiu. E o que se seguiu... nem mesmo esse "outro" sol conseguiu alguma vez iluminar. Um "outro" sol, que se espalhava naquele mesmo chão, como sempre, mas que nunca mais alcançou romper o nevoeiro cerrado que ali acabou por se instalar.

Fotografo esse "outro" sol sem que, por um segundo, me passe pela cabeça vê-lo como vejo o sol de agora. É "outro", para sempre "outro". "Outro" que, por vezes e tortuosamente, me puxa para esta viagem através dele, através da ladeira da história da sua luz ao longo do meu tempo - aquele meu tempo ali -, viagem essa que acaba sempre na constatação de que, por mais que este "outro" sol se esforce, nunca mais terá como me iluminar.

Resta apenas virar as costas e deixá-lo lá.

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