A propósito dos dias que também são datas, perguntava se devia dizer alguma coisa e ouvi que deveria seguir as indicações da minha sensibilidade, ela melhor que ninguém iria ensinar-me o caminho, ela que também sabe como é. Porque se colocava a questão se seria melhor lembrar... porque se por um lado revela cuidado e atenção o que é igual a carinho, por outro corremos o risco de levantar a tampa de uma caixa que não se quer abrir, não nesse dia que também é data.
Não precisei procurar a resposta, ela existe em mim naturalmente. Não precisei perscrutar a fundo os meus sentimentos para saber o que sei.
Somos papel perfurado. O buraco que um dia se abriu está sempre lá, já faz parte da nossa composição, do nosso design. É isto que também somos desde então. O buraco acompanha-nos todos os dias, já pertence ao nosso organismo.
Claro que o dia que também é data é a referência temporal que nos faz regressar mentalmente áquele dia em que tudo aconteceu, fazendo-nos reviver os passos, os momentos, as sensações, uma a uma e com mais pormenor. Mas não é só no dia que também é data que isto acontece. As perdas, as nossas mortes, vivem connosco e às vezes basta um gesto, uma música, um odor a perfume, uma expressão verbal para que latejem mais um bocadinho. Estão lá, vivas, mesmo que pontualmente mais dormentes, estão sempre lá.
Não precisei procurar a resposta. De papel perfurado para papel perfurado assinalei com um beijo e só. Um beijo para todos os dias, não só aquele, um beijo que só nós percebemos bem o que quer dizer.
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