O dia tal como eu. Chove. Faz sol. Parece simples, não é? Nos dias do tempo, do tempo meteorológico, é simples, é assim, sucedem-se, o sol e a chuva, porque assim tem que ser. Simples.
Quase que me sentei no chão com a caixa redonda apertada entre as pernas em arco. Quase. Visualizei a cena, vi-me de cima para baixo, como se me dependurasse no tecto. A caixa sempre fechada, quase, quase pronta para ser aberta. No último segundo, recuava. Porque a caixa contém um poder adormecido que, ao ver a luz do dia, se escapa para fora do seu invólucro como névoa e envolve-nos. O poder das lembranças, das saudades que não têm fim, porque as saudades são assim, por definição, incompletas. Recuei. Tive medo. E a cena não passou além de uma imagem mental. "Não devemos tentar esquecer, devemos abraçar e guardar o que tem de bom." Mas é mais fácil pôr de lado...
Os olhos pregados no tecto, a noite mal dormida a insinuar-se, abro os braços ao ar e não sei o que faço. Sem me apetecer mexer, sair dali, absorta, sem vontade. E reparo que, se não tenho cuidado, me deixo cair, mais e mais, para dentro de mim, mais reclusa, mais solitária. "A sua alma está fechada, vê-se. Ainda não está disponível." Mas tenho saudades de mim assim.
As palavras e os gestos que ficam por terra. Não têm para onde ir. "Devemos dizer às pessoas quem são elas para nós, o quanto gostamos, o quanto as queremos. Devemos dizer porque não se sabe o dia de amanhã e o peso da palavra não dita pode ser insuportável."
On hold. "É extraordinária a capacidade que o ser humano tem que ficar suspenso."
E consigo ver-me mais autónoma, menos desamparada e disse que essa era a grande diferença. "Já viu? Talvez saia de tudo isto muito mais forte."
Em resumo, sou outra. Mas em resumo, acho que ainda tenho demasiado da mesma.
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