quinta-feira, outubro 14, 2010

O EU não sabe nadar, iôôôô...!

Habituada a andar no fio da navalha, a desafiar o destino, a conviver de mão dada com o risco, lá fui eu dar umas voltas que precisava. Como sempre, na minha mente ressoava: "ah, isto ainda aguenta mais um bocadinho", "ponho a caminho de lá", "não, espero para ir áquela bomba nova e trato do assunto". Eis senão quando o meu EU (o carro, não o outro) se começa a engasgar, a engasgar, ainda pensei que por causa destas mudanças de temperatura, que este tempo não faz bem a ninguém, ora chove ora faz sol, mas não... estava com a garganta seca e não tinha mais onde ir beber. Mais um ou dois engasganços e toma a derradeira decisão de não andar mais. E eu estava onde?? Em Chelas...

"Ok, T., pensa de ti para contigo o que é que vais fazer." Ainda tento um ou dois telefonemas mas ninguém me atende. O que faço, o que não faço, não posso deixar o carro aqui enquanto vou algures buscar gasolina porque embora esteja encostado à berma, há carros estacionados que não saiem portanto vamos lá embora mas é tentar empurrar isto para cima do passeio para não incomodar ninguém. Destrava, ponto morto, abre o vidro e, com uma mão no volante e outra na janela, começa ela a empurrar. Pois... mas o carro é mais pesado do que eu pensava e, ainda por cima, está num piso ligeiramente inclinado para o sentido contrário ao que eu pretendo seguir! Conclusão, empurra, ruge, bufa e nada. O dito, quanto muito, anda ainda mais para trás.

"Ok, T., tu pensa, mulher, que és uma rapariga desempoeirada e desenrascada, uma mulher moderna que sabe resolver os seus problemas, vamos lá a raciocinar e a ver o que se pode fazer.". Nisto, olho em volta e vejo uma oficina de pneus ali perto. Nem mais! Certamente que existe por lá um par de mecânicos fortalhaços que, num abrir e fechar de olhos, me tiram esta gaita do caminho. Ali vai ela, entra, tudo em silêncio, ninguém a trabalhar. Espera, tosse, diz "boa tarde", e lá do fundo aparece um mecânico... pequeno... franzino... a passar dos 60... Ooookkkk... mas lá teve que ser...

- Boa tarde, peço imensa desculpa mas preciso de uma ajuda... fiquei sem gasolina, tenho o carro ali a empatar, será que por aqui não haverá alguém que me possa ajudar a deslocá-lo?

Simpático, afável, o senhor ofereceu-se quase imediato. Ainda olhou em volta, a ver se algum colega imaginário se materializava mas não, não teve sorte. E assim nos dirigimos à viatura. Primeiro tentámos para a frente mas era perigoso, estávamos a seguir a uma curva, e o carro é pesado (também para ele, oh, que espanto!) e tinhamos que nos atravessar na estrada, "não, assim não dá". Depois ele decidiu que iriamos para trás e que ele empurrava sozinho (assim também eu, era a descer!) e que ficasse eu ao volante. Manobra e mais manobra e lá enfiei o EU (o carro, não o outro) na garagem do homem (salvo seja!). Eu suava... ele também... aliás, acho até que ele estava quase a desfalecer...

- Muito obrigado pela sua ajuda, peço imensa desculpa mais uma vez, agradeço imenso, vou então à bomba mais próxima buscar gasolina.
- E tem recipiente?
- Eerr... então mas eles não vendem garrafões lá?
- Não! Tem que levar, depois eles enchem! Deixe, que tenho aqui um.
- Muito obrigado, muito obrigado...

E lá fui eu, de garrafão de 5 litros, marca BP, Chelas afora. " Ó T. mas, que mal te pergunte, o que estavas a fazer em Chelas? Não me digas que foste buscar droga?". Não, não fui... mas, assim como assim, mais valia! Ia Chelas afora, com o garrafão de 5 litros e, eventualmente, acompanhada por um qualquer elefante voador, com a cabeleira do Slash, a cantar Madredeus! Era bom. Mas não, desgraçadamente lúcida era como eu estava.

Chegada à bomba, dirijo-me a um funcionário. "Mas sabe, eu estou de folga, só vim aqui por acaso, vá ter ali com o meu colega". E fui. O colega falava ao telemóvel (não é proibido nas bombas de gasolina???), esperei, esperei mais um bocadinho, até que ouço:

- Deixe cá ver isso, que eu trato (voltou atrás o tal que estava ali por acaso).
- (e eu simpaticamente, porque eu consigo ser simpática quando quero) Não, deixe estar, eu espero. Então o senhor está de folga e eu aqui a dar-lhe trabalho..!
- Não custa nada! A senhora está pior que eu de certeza! (pois... devo estar... não estou drogada!)
Então, mas faltou-lhe a gasolina, foi...? ("calma, acalma-te T., ignora o tom paternalista, faz favor, é uma questão de necessidade, finge que ele não fez o sorrisinho "mulher ao volante...". Sorri!)
- (sorrindo) Pois, veja lá, acontece aos melhores! ("não podias estar calada, pois não???")
- Mas olhe, tem que arranjar uma garrafa de água e fazer-lhe um corte para servir de funil senão não consegue verter bem a gasolina lá para dentro.
- Eerrr... certo, não se preocupe, o carro está ali numa oficina, eles devem ter qualquer coisa do género. Obrigado!

E aqui vou eu de novo, desta vez com o garrafão a pesar e o sol a fazer-se sentir um bocadinho mais. Chego, o mecânico amável aparece e diz: "Huuummm.. temos que ver se arranjamos aqui uma garrafa de água e fazer-lhe um corte para servir de funil senão não consegue verter bem a gasolina lá para dentro" (Caramba! O consenso absoluto no que diz respeito ao "desenrasca" no mundo da reparação automóvel! Estou impressionada!). Mas, por acaso, até encontrou um funil mesmo funil e "para a menina não se sujar" tratou ele de meter mãos à obra. O funil/funil não devia ter muito uso e por isso o tempo já se tinha encarregado de lhe fazer um golpes na borracha, de maneira que uma parte da gasolinha (e dos 5 euros e tal e das energias que gastei a fazer caminho para lá e para cá!) vertiam para o chão...

Mas pronto, lá bebeu o que havia, lá se pôs a andar até à bomba, "já agora, sendo que ainda estou em Chelas, é melhor não arriscar", lá decidi que merecia um chocolate por toda aquela provação. E, enquanto comia, esforçava-me para pensar nos aspectos positivos do episódio em causa:

- Nunca tinha ficado sem gasolina em andamento. Mais uma coisa que posso acrescentar à lista dos been there, done that! Experiência de vida adquirida, portanto.
- Nunca tinha tentado empurrar o meu carro sozinha. Verifiquei assim, na prática, o que sempre pensei: não fui feita para certas coisas, pague-se a quem as faça!
- Nunca tinha tido o privilégio de penetrar tão profundamente no mundo da reparação automóvel. Fiquei a saber que os mecânicos, no geral, são tipos dados à bricolage, verdadeiros mestres do corte e costura, o que revela uma certa sensibilidade para as artes por mim desconhecida. E que 1 garrafa de plástico + 1 corte = 1 funil.
- Sempre achei que a gasolina era castanha ou amarelada nunca tendo, de facto, olhado bem para a dita. Mas não é, é roxa, ou pelo menos a minha era, o que me fez perceber que combustível pode ser algo altamente fashion.
- Tudo isto aconteceu numa hora de almoço... e por isso ainda tinha uma tarde e noite inteirinhas para me acontecer mais alguma coisa tão espectacular como esta!

Há raparigas cheias de sorte...

2 comentários:

F disse...

Minha amiga, devo dizer-te que há muito que não me ria tanto. E mais, acabei por ler o teu post a duas colegas que também iam tendo uma congestão de tanto rir. No mínimo hilariante e lindamente bem escrito - aliás como é teu apanágio.
Ainda bem que tenho o teu blog para ter momentos no dia em que a crise não existe, nem tão pouco as depressões pessoais, e consigo ser eu, simplesmente eu, a rir muito.

t disse...

Minha querida, fico muito contente. Se ele (o blog) não servir para mais nada já me enche de orgulho e satifasção, já vale mais que tudo, se serve para te fazer rir!

(caraças, miúda, quase que me vieram as lágrimas aos olhos! Olhó disparate... sniff...)