Ontem à noite, dando uma volta pela minha rua, o cheiro de noite de Verão trouxe-me à memória alguns Verões passados na "santa terrinha".
Era uma excitação! Na "santa terrinha" tinha a liberdade que não tinha aqui e um grupo de amigos que, de ano para ano, se tornava maior. Saía todas as noites, com os meus All Star azul claro e blusão de ganga atado à cintura, preparada para só voltar a casa bem tarde, apesar de ter marcadas horas para chegar. Mas não importava. Contava que o facto de estar num sítio pequeno, onde toda a gente se parecia conhecer, descansasse os meus pais e tornasse o seu sono mais pesado. E a verdade é que assim era.
Muitas vezes não havia nada de especial para fazer. Dávamos umas voltas pelos cafés a ver quem de conhecido se encontrava, bebíamos umas imperiais ("finos" por aquelas bandas), jogávamos snooker, matraquilhos ou Tetris e sentavámo-nos no jardim à conversa até às tantas.
Nos dias das festas da vila, o programa era mais completo: fogo de artifício, música (regra geral pimba, como convém), mais imperiais, barraquinhas de comida (com o melhor caldo verde do mundo!) e oportunidade única para rir a observar o que acontecia no dancing...! O dancing não era mais que um estrado de madeira, com uma cerca enfeitada com as mesmas flores de papel que enfeitavam as ruas nos dias de festa. E era a "pista de dança"! Era lindo ver os casalinhos de namorados a dançar, com as mães, de tocaia, penduradas na cerca do lado de fora, zelando para que não houvesse abusos e tudo corresse na maior das decências. Era genial ver as meninas encostadas do lado de dentro, à espera que alguém as convidasse para dançar, com as mães, claro, que iriam aprovar ou não os supostos pretendentes. Para mim, adolescente da cidade, era como se estivesse a entrar num outro mundo. No mundo da adolescência da minha mãe, talvez! Ali sim, via e entendia o que queriam dizer quando se referiam ao "atraso" no interior do país. As mentalidades ainda pareciam de outro século. Era um divertimento!
Muitas vezes me pergunto como me divertia tanto com coisas tão simples. Hoje em dia sou muito mais exigente... mas nem por isso me divirto mais. O que mudou em mim para além do óbvio?
A resposta é simples e ficou clara na minha cabeça ontem, enquanto apreciava a noite quente: eu aproveitava o momento! Vivia-o, verdadeiramente! Não interessava o que ia fazer no dia a seguir, não interessava que, inevitavelmente, as férias tivessem que acabar, não pensava nas aulas do ano lectivo que ia começar, ou nas notas que iria ter, ou nos objectivos para o futuro. Não! Simplesmente vivia aquele momento, vivia o presente, aproveitava-o ao máximo sem pensar em mais nada. E por isso ele me sabia melhor que tudo mesmo que não fosse nada de especial! Para mim, o importante era cada dia, cada noite, mesmo que visse sempre as mesmas caras, mesmo que perdesse pela milésima vez nos matraquilhos, que já conhecesse de cor todos os níveis do Tetris ou que me ficasse a doer o rabo de estar tanto tempo sentada nas escadarias do tribunal, sem fazer nada a não ser conversar. Vivia-o, aproveitava-o, saboreava-o com tudo o que tinha, de bom e de mau, e com isso estava, sem saber, a gravá-lo na memória.
Carpe diem, como dizia o outro. E olhem que ele tem razão... faz toda a diferença.
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