quarta-feira, janeiro 06, 2010

Mistletoe

Preparei-me com antecedência. Pensei muito no assunto porque sabia que tempos difíceis se avizinhavam. Preparei-me como sempre faço, limpando as armas e a armadura, colocando tudo no seu lugar, operacional, para enfrentar o embate.

Esforcei-me por ignorar luzes, cor, música, cheiro a fritos, açúcar e canela, ambiente festivo. Apreciei-os por si só, sem os conotar com nada. As prendas, poucas, foram compradas só para algumas pessoas muito especiais. Quanto ao resto, uma mão salvadora, sem que dissesse quase nada, tratou do que era suposto. Não enfeitei a casa, praticamente não fiz embrulhos e apenas me comprometi com a sobremesa que tipicamente sai das minhas mãos e da qual toda a gente já está à espera. Mas só para não desiludir.

Tentei passar-lhe ao lado esperando o mesmo tratamento em retorno e chegado o dia só me lembrava das frases que alguns me disseram e que repeti incessantemente para mim mesma: "vais ver que passa num instante", "encara apenas como um jantar e um almoço", "pensa que depois estás de férias".

O jantar chegou e eu lá fui, de forma automática. Não senti calor, ligação, emoção e parecia flutuar por cima daquilo tudo como que assististindo à cena de um filme. Uma pequena parte de mim desejava fugir, o resto não estava mesmo lá. Praticamente não falei porque não tinha nada para dizer e, algumas vezes, retirei-me do meio da confusão para estar comigo mesma. Sentia ausência. De pessoas, de vozes, de comentários típicos, de ombros onde me encostar. E, principalmente, sentia falta de mim. Não sendo a única a enegrecer o ambiente, as horas anteciparam-se, as prendas abriram-se sem regra e meia hora depois estava em casa.

No dia seguinte, a mesma coisa. Mais uma vez, em ambiente perfeitamente familiar, sentia-me uma estranha. Algumas palavras na minha direcção tentaram tirar-me do estado vegetativo "está óptima a tua sobremesa, como sempre", "e tu lembras-te quando eras pequenina isto assim, assado...?". Em vão. Sorri por delicadeza e viajei outra vez. E também nesse dia, tudo terminou cedo.

Não senti nada do que adorava sentir, não fiz nada do que costumava fazer. Apenas um ritual, que não era meu e que talvez passe a ser, mas apenas para mim: contei os doces. Eram 15.

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