Sim, sou eu, continuo a ser eu. Sempre acreditei, agora vejo. Sou eu, a renascer talvez, numa forma ligeiramente diferente mas eu, a mesma. No outro dia disseram-me "bem vinda de volta!". Sorri para mim mesma. Não foi a primeira vez que ouvi esta expressão mas foi, talvez, a primeira vez que a consegui reconhecer. Sou eu, com tudo de bom e tudo de mau, esperando que o bom seja ainda melhor, que o mau se tenha temperado, equilibrado e subsista apenas na medida da sua utilidade (sim, porque tenho que reconhecer que uma certa preversidade pode, de facto, ser muito útil) mas eu. Ainda não a 100%, ainda não totalmente de pé, de costas direitas e nariz empinado, mas eu. Vi nos olhos dos outros, amigos de todo o sempre, a fazer-me sentir em casa, a sentir-me como antes; vi na côr dos meses. Sim, eu pinto os meses e olhando para trás vejo de forma muito nítida a paleta da minha vida recente. Olhando para trás, vejo os primeiros tempos em cores suaves, alegres mas cortadas por rasgos violentos de vermelho sangue a embeber toda a tela. Período de emoções fortes, desalentos, agressividade. Depois, o vermelho a esbater-se, a dar lugar a um lilás. Lilás com restos de vermelhidão mas a roxear pelos dias com tons de azul. O azul escuro da tristeza que finalmente invade e se prolonga por muito tempo até chegar quase ao preto, ao expoente máximo de negritude. A partir daí suaviza, aos pouquinhos, muito devagar, tão devagar que parecia parado. Mas hoje vejo que foi esbatendo com o passar do tempo e deu origem a um determinado tom de rosa. É aí que estou agora. Num rosa velho, ainda meio manchado, ainda com laivos de preto, vermelho, azul, as cores de antes ainda na sua base. Mas rosa. E esse rosa, rosa velho como disse, fala-me de perdão, perdão a mim mesma e aos meus defeitos, fala-me de dar valor ao que realmente tem valor, fala-me de rigidez amaciada, de contornos mais suaves, de reconhecimento do que sou, de quem sou e o que mereço. Fala-me também de reconstrução, de mim e da forma como vejo o mundo e os outros. Fala-me de paz, a paz que quero e de segurança, crença na matéria de que sou feita.
Sou eu, sim, sou eu. E assumo-me e aceito-me e imponho-me à vida dessa mesma forma.
Sem comentários:
Enviar um comentário