Jurei para nunca mais. Lembro-me como se fosse hoje embora pareça ter sido há uma eternidade. Jurei para nunca mais, vezes e vezes sem conta. Jurei para nunca mais e cumpri. Fui construindo os meus muros, construindo, tijolo a tijolo, e cerquei-me a toda a volta. Jurei para nunca mais e repeti essa palavras muitas e muitas vezes, para que formassem o meu eco, sempre a vibrar dentro das minhas paredes. E consegui de tal forma que o som dessa jura me envolveu e eu deixei de ouvir o que se passava lá fora. Por isso, não percebi que algo se aproximava. Não ouvi os murmúrios debaixo da terra que indicavam que ela ia começar a tremer. Não ouvi os avisos dos outros, não percebi que o planeta já se revolvia até ao momento em que me atingiu, até ao momento em que se começou a abrir o chão debaixo dos meus pés. Nessa altura, enquanto tentava escapar das fendas, vi o meu muro, aparentemente tão seguro, a ruir. Jurei para nunca mais, jurei em forma de tigolo e argamassa, jurei solidamente, pedra após pedra. Mas o muro caiu afinal, sem que eu esperasse, sem que eu tivesse tempo de reagir. Jurei para nunca mais e nessa altura percebi que as minhas juras cimentadas me tinham levado exactamente ao ponto de partida. Porque eram juras rígidas, duras, sem nada de maleável em si. Não eram, por isso, à prova de tremor. Jurei para nunca mais e enquanto as observava a cair por terra percebi que me tinha iludido, que elas me tinham enganado e que me fizeram acreditar numa rigidez positiva, protectora quando afinal era ela agora a minha maior inimiga. Jurei e agarrei-me ao juramento não vendo nada para além dele. Jurei e essa jura foi um erro, talvez o meu maior erro.
Agora, construo com calma uma outra estrutura. Numa espécie de ferro moldável, com uma rede de recinto de escolinha primária. Protejo-me mas sem perder o ar, cerco-me mas aberta para o lado de fora, para ouvir, para ver, para que haja entrada e saída de gente, partilha de emoções, energias, sentimentos, sensações de sol e vento. Estou mais exposta, sim, mas numa medida que me permite receber a luz do lado de lá, dar-lhe a mão e, ao mesmo tempo também, preparar-me para os ventos negros logo que surjam no horizonte.
Não, não juro que não caia e por isso não juro que não tenha que começar tudo outra vez. Mas juro, sim, que vou cuidar dela como cuido de mim, como algo mutável e vivo, que pode moldar-se às circunstâncias, que pode crescer e viver e mover-se nos dois lados do mundo.
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