quarta-feira, outubro 28, 2009

De manhã

Os dias começam sempre da mesma maneira, com peso, com desalento, trazendo consigo a noção de que está a acordar para um dia que não é seu, que não devia ser o seu. Angústia, chamam-lhe angústia.
- Onde estou? Porque é que estou aqui? Quero-me de volta...
Mas segue, os passos automatizados, as tarefas automatizadas porque tem que ser. E a sensação de inevitabilidade a preencher todos os cantos, como o tal copo com pedras no qual depois entra a areia. A areia a espalhar-se por todo o lado, inundando cada centímetro livre, acamando, grão por cima de grão,  ocupando lugares onde antes existia ar. E fecha. Nem um som mais se ouve. Empedernida.
- E agora? O que faço agora?
- Anda, anda para a frente, parece ouvir dizer, porque não há mais nada a fazer.
São as paredes que falam, contam histórias de outros tempos e os fantasmas vagueiam para se certificar que não são esquecidos, que são lembrança constante do que foi e já não é.
Dizem que não se deve voltar onde se foi feliz e talvez seja por isso que o universo parece contra. Talvez seja por isso que a areia acama e abafa. Para garantir que nada mais mexe, que nada mais entra ali. E a tristeza confirma, nada mais há a fazer.

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